Elo entre tatu e arqueologia dá IgNobel ao Brasil
Prêmio antecede Nobel e é concedido a estudos, como o de dupla paulista, ?que 1.º fazem rir e, depois, pensar?
Carlos Orsi
Um estudo sobre os danos provocados por tatus a sítios arqueológicos rendeu aos brasileiros Astolfo Mello Araujo e José Carlos Marcelino um prêmio IgNobel, uma paródia do Nobel concedida anualmente pela revista americana Annals of Improbable Research (Anais da Pesquisa Improvável) a trabalhos científicos "que primeiro fazem rir e, depois, pensar". "Creio que se trata do primeiro IgNobel do Brasil (o prêmio está na 18ª edição)", disse Marc Abrahams, editor da Annals e mestre-de-cerimônias da festa de premiação, realizada na noite de ontem na cidade de Cambridge, nos Estados Unidos. "Toda a nação vai sair às ruas em desfiles e festas por causa disso, certo?"
Abrahams provavelmente vai se decepcionar com a reação do povo brasileiro, mas Araujo, ao menos, gostaria de estar presente para receber o prêmio. "Pelo que me falaram é muito divertido. Você pode até mesmo dar uma curta palestra sobre o seu trabalho no MIT (Instituto Tecnológico de Massachusetts), o que, convenhamos, não é pouca coisa", afirma. "Infelizmente, já gastei todo o meu financiamento acadêmico deste ano indo para a Espanha e a Irlanda."
Em nota encaminhada à organização do IgNobel, os dois autores agradecem: "Já que não existe um Nobel para arqueologia, o IgNobel sempre é bem-vindo!", dizem.
Publicado em março de 2003 pela revista especializada Geoarchaeology, o estudo dos brasileiros foi realizado com tatus no Zoológico de São Paulo, quando Araujo era funcionário da Prefeitura. Lá, foi criado um falso sítio arqueológico. "Qualquer arqueólogo minimamente observador percebe, ao longo de sua carreira, que tatus são um problema real", diz Araujo. "Eu percebi isso ao trabalhar em várias partes do Brasil. Lembro-me especialmente de ter visto belos e grandes fragmentos de cerâmica indígena serem ejetados de um buraco de tatu, quando trabalhei no Xingu."
Entre outras coisas, os animais podem misturar artefatos, carregando peças de um nível do sítio para outro. "Não há números a respeito e, na verdade, nosso trabalho é único, por incrível que pareça", diz o arqueólogo, que atualmente trabalha em escavações em Minas e dá aulas na Universidade de São Paulo (USP). "Nenhum arqueólogo tinha se debruçado sobre o tema."
Araujo diz ter recebido a notícia de que ganhara um IgNobel com tranqüilidade: "O Marc Abrahams, que é o coordenador do prêmio, entrou em contato. Parecem ser pessoas bem legais. Sondam primeiro para ver se o laureado não vai se ofender. O processo é todo bem amigável." Ele não espera um impacto do IgNobel em sua carreira. "O prêmio foi uma coisa divertida. Achei uma pena não poder ter ido à festa, mas realmente não muda nada. Se ainda eles premiassem com dinheiro, como o Nobel", lamenta.
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