Abrasca levará discussão "às últimas conseqüências"
Valor Econômico - 12/6/2008
A Associação Brasileira das Companhias Abertas pretende ir "às últimas conseqüências" para evitar o efeito fiscal sobre as novas regras contábeis, em vigor neste ano. "Não levaremos isso na maciota", afirmou Alfred Plöger, vice-presidente da (Abrasca). Mais do que posição da Receita no Rio Grande do Sul, que interpretou há aumento de impostos, Plöger mostrou-se preocupado com a idéia de que há dificuldade de se garantir a ausência de impacto tributário sobre as mudanças inseridas pela Lei 11.638. Essa interpretação vem ganhando força nas discussões da questão. Plöger disse que irá à Justiça, se preciso. A interpretação da delegacia gaúcha a respeito dos incentivos fiscais contribui para o já tumultuado contexto em que a reforma da legislação contábil brasileira está inserida. A aprovação da lei no apagar das luzes de 2007, para garantir vigência a partir deste ano, trouxe muita complicação ao processo de convergência das regras.
O prazo para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) normatizarem as diretrizes fornecidas pela lei ficou apertado. Além disso, não houve tempo para a Receita Federal se posicionar previamente. Para o tributarista Gustavo Haddad, do Lefosse Advogados, o ideal seria que a nova lei contábil surtisse efeitos somente a partir de 2009. "Dessa forma, tanto auditorias, empresas e Receita teriam tempo para analisar o texto e se preparar." Como não houve esse período para estudar a legislação, as empresas ficaram sujeitas a surpresas.
Reina, portanto, um clima de incerteza e temor de que o Fisco consiga morder uma fatia maior dos ganhos das companhias, já que diversas alterações na contabilidade têm efeito potencialmente positivo sobre o lucro. Caso haja reflexos fiscais da aplicação da nova lei, é possível que algumas empresas também paguem menos impostos, se os lucros forem reduzidos pelos ajustes às novas normas. "Não queremos isso. O combinado era nem aumentar, nem diminuir", ressaltou Plöger.
Haroldo Levy, vice-coordenador de relações institucionais do CPC, afirmou que, de fato, os debates com a Receita Federal vêm mostrando que o tema é mais complexo do que se imaginava. "Há uma certa decepção por essa falha da análise legal prévia."
Ele disse que somente o órgão federal poderá responder em definitivo sobre o assunto. No entanto, contou que aumentam as chances de que neste ano ocorram alguns efeitos da troca de legislação sobre o pagamento de impostos. Levy disse que parece haver necessidade de procedimentos legais para garantir a tão aguardada neutralidade fiscal, para os quais não há tempo hábil em 2008. "Não é o que a gente queria, mas esperamos que seja conjuntural."
Ele enfatizou, porém, que há sinais de que a Receita Federal continua trabalhando para minimizar os efeitos da nova lei.O texto da Lei 11.638 afirma que não haverá tributação sobre os chamados "ajustes de harmonização" com as regras internacionais. Porém, não deixa claro se tal tratamento é para todas as alterações necessárias e abre espaço para questionamentos. Além disso, o emaranhado de regras e leis tributárias dificultam um consenso simples para o tema.
Antônio Carlos Santana, superintende de normas contábeis da CVM, afirmou que a decisão da delegacia gaúcha e mesmo a ausência de uma posição da Receita não interferem no processo de normatização. A autarquia continua trabalhando para cumprir o cronograma, estabelecido em conjunto com o CPC, de regular as mudanças inseridas pela lei ainda durante este ano. Plöger disse que uma conseqüência possível, caso não haja garantia de ausência de impacto fiscal, é que as companhias optem por não ajustar alguns números do balanço, temendo pagar mais impostos. Essas empresas teriam ressalva nos balanços, feitas pelos auditores independentes. No entanto, caso haja uma grande quantidade de casos iguais, a ressalva ficará banalizada. "Não terá nenhum valor."O ambiente de incerteza gerado pela falta de uma posição da Receita já trouxe efeitos para os balanços do primeiro trimestre. Houve companhias que, já temendo esse cenário, acabaram por levar uma canetada dos auditores.
Além disso, as empresas mostram desconforto em falar de um possível aumento de sua lucratividade - justamente por temerem chamar atenção do Fisco. Mesmo as empresas que estimaram, em nota explicativa, possível aumento no lucro, preferiram não dar publicidade ao assunto. A maioria, entretanto, não apresentou nenhum tipo de cálculo prévio.
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