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03 junho 2008

Efeito da IFRS

O texto a seguir, enviado por Ricardo Viana e publicado no Valor Econômico, mostra o efeito da utilização da IFRS em algumas empresas brasileiras.

Ajuste milionário no balanço
Por Graziella Valenti e Silvia Fregoni, de São Paulo
Valor Econômico - 02/06/2008

Nada menos do que uma redução de R$ 830 milhões no lucro líquido e no patrimônio. Esse é o tamanho do ajuste que a Vale do Rio Doce sofreria no primeiro trimestre caso a nova legislação contábil brasileira estivesse vigente desde já. Com isso, a empresa teria uma redução substancial sobre a lucratividade do período, que foi de R$ 2,2 bilhões.

Nem todos os investidores estão atentos, mas, depois de a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) muito insistir, as companhias começaram a fornecer nas notas explicativas do balanço a estimativa do impacto das novas regras de contabilidade. No caso da mineradora, segundo a nota, a perda decorreria de efeitos da variação cambial sobre os investimentos no exterior.

Porém, os números fornecidos ainda estão encobertos por muitas dúvidas. Há mais perguntas do que respostas em torno do processo de adaptação dos balanços à lei 11.638 - aprovada no apagar das luzes de 2007, o que deixou o prazo para regulamentação apertado. A despeito de toda a confusão existente já na homologação da legislação, a CVM tumultuou um pouco mais o ambiente ao pedir que as empresas fizessem alguns ajustes já a partir do primeiro trimestre.

A Vale não é a única ter ajustes de impacto a fazer, e nem todos seriam negativos. No caso da Eletrobrás, haveria alta de R$ 356,7 milhões no lucro e de R$ 260,5 milhões, no patrimônio. A Petrobras elevaria em R$ 388 milhões os ganhos da última linha do balanço e reduziria em R$ 459 milhões o patrimônio. Pode parecer pouco, mas esses números produzem efeito ainda maior na análise de múltiplos - indicador que os analistas utilizam para comparar os preços das ações de empresas brasileiras com o das estrangeiras.

A agência de classificação de risco Standard & Poor's já considera as informações na análise dessas companhias. Porém, Marcelo Costa, diretor da área de classificação de empresas, explicou que boa parte dos dados já estava incorporada às avaliações. "Já pedíamos às empresas o que não divulgavam."

Alex Finn, sócio da PricewaterhouseCoopers (PwC) no Reino Unido, enfatizou a importância de as companhias saberem comunicar bem as mudanças contábeis.

A nova lei contábil brasileira tem como principal finalidade o alinhamento aos padrões internacionais, adotados em mais de 100 países, o IFRS. Pelo cronograma da CVM, em 2010, o país deverá ter convergido integralmente as regras domésticas às estrangeiras.

Finn destaca que a empresa precisa aproveitar a oportunidade de tornar seus números comparáveis a de outras companhias globais - com destaques para as européias, que utilizam o IFRS. Ele lembra que quando houve a transição no Reino Unido as ações das empresas sofreram perda média de 5%, por conta da falta de habilidade das companhias ao tratarem do tema.

A empresa do ramo imobiliário Rossi Residencial viveu isso na pele. Os papéis da empresa caíram 15% no dia que foram divulgados os números do primeiro trimestre. A administração decidiu se antecipar e já adotar procedimentos previstos no IFRS - mesmo aqueles que ainda não estão contidos na nova lei contábil brasileira.

Tal iniciativa provocou impactos negativos nos números da Rossi. A margem líquida - relação entre lucro líquido e receita líquida - caiu três pontos percentuais. Mas o efeito sobre as ações decorreu, especialmente, da dificuldade do mercado em compreender as alterações. "Foi falha da comunicação da companhia. Não soubemos explicar as mudanças aos analistas", admitiu Gerson Cohen, gerente de controladoria. A falta de didática deu trabalho: foram necessárias reuniões com investidores para explicar o que aconteceu.

Enquanto algumas companhias se esforçaram para apresentar em números uma estimativa dos impactos mais relevantes da adequação à lei, outras continuam informando que ainda não é possível fazer cálculos nesse momento. A principal alegação é a falta das normas da CVM detalhando as diretrizes gerais dadas pela lei. Dentre as dez maiores empresas brasileiras por valor de mercado (ver quadro acima), apenas metade forneceu expectativas numéricas dos impactos.

Fabio Cajazeira, sócio da PwC responsável pela área de mercado de capitais, explicou que quantificar os efeitos da lei é trabalho praticamente equivalente ao de contabilizar as mudanças. "Colocar no balanço é o mais fácil depois de decidir a metodologia, levantar os dados e fazer os cálculos."

Para companhias de médio porte e menor complexidade dos negócios, por vezes é mais fácil se adaptar. A Eternit e a Indústrias Romi já adotaram integralmente o padrão internacional. Até então, apenas Gerdau e Grendene usavam o IFRS. "Muitas vezes, é mais simples e rápido para a empresa menor", disse o professor Eliseu Martins, da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi) e vice-coordenador técnico do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC).

A Romi decidiu antecipar o uso do IFRS no primeiro trimestre e já republicou os dados de 2007. "Quisemos elevar a transparência e inovar", disse Luiz Cassiano, gerente de relações com investidores.

Reginaldo Alexandre, também membro do CPC e vice-presidente da associação de analistas de investimento em São Paulo (Apimec-SP), explicou que antecipação ao IFRS é relevante, principalmente, para as menores. Elas podem aproveitar o bom momento do país e a melhora nos balanços para acessar crédito no mercado externo, antes restrito às grandes companhias.

Alexander Carpenter, analista de crédito da Moody's para a América Latina, acredita que a lei terá impacto relevante nas notas de risco. "Poderemos dar 'ratings' mais altos porque as empresas passarão a divulgar fluxo de caixa."

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