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10 setembro 2007

Deloitte e

Esta notícia já foi postada anteriormente aqui. Mas não deixa de ser interessante saber como uma empresa conceituada entra numa situação em que é acusada de participar de fraudes contábeis. Da revista Istoé Dinheiro da semana:

Deloitte contra a parede
Consultoria sofre processos judiciais após auditar documentos e registros contábeis de exportações fraudulentas de soja. E defende-se acusando outra empresa, a Globalbank, de coordenar as operacões.

Por Milton Gamez
A cobrança excessiva e complexa de impostos faz do Brasil um paraíso para as empresas que oferecem serviços de planejamento tributário. Grandes firmas internacionais disputam com as locais o rentável mercado de soluções para reduzir a mordida do governo, que passa de R$ 800 bilhões por ano. Todas dizem que operam dentro da lei e usam as brechas da legislação para favorecer os clientes. O problema é que nem sempre o planejamento tributário termina bem para as partes envolvidas. Uma ferrenha briga judicial, exposta ao público na semana passada, mostra que os riscos nem sempre compensam os ganhos com a economia de impostos de maneira, digamos, “criativa”. Duas consultorias, a Deloitte e a Globalbank Consulting, tiveram a imagem chamuscada depois de sofrerem processos milionários de empresas que contrataram seus serviços e acabaram multadas pela Fazenda paulista. Acionadas judicialmente por grandes companhias – como Casas Pernambucanas, Tubos e Cone xões Tigre e Ficap –, a Deloitte e a Globalbank passaram a acusar-se mutuamente pela responsabilidade das operações irregulares de suas clientes. A briga é desproporcional: a Deloitte, uma das maiores consultorias do mundo, tem muito mais a perder com os danos à sua imagem do que a Globalbank, empresa de Pedro Paulo Leoni Ramos, ex-secretário de Assuntos Estratégicos do governo Collor.

Tudo começou a partir de 2002, quando as empresas foram procuradas por consultores com uma proposta de planejamento tributário, no mínimo, ousada. O plano era o seguinte: as empresas passariam a comprar óleo e farelo de soja para exportação. Ao comprarem soja de outro Estado (Mato Grosso) para exportar, elas seriam beneficiadas com créditos fiscais e teriam descontos nos pagamentos dos impostos devidos. Teriam créditos de ICMS (alíquota de 12%), de Cofins (7,6%) e de PIS (1,65%). Dito e feito. Embora não tivessem tradição nenhuma no setor agrícola, a Casas Pernambucanas, a Tigre, a Ficap e a Adria aceitaram a sugestão dos consultores e passaram a acumular créditos fiscais com a compra e venda de soja. O problema é que essas operações eram fictícias, ou seja, existiam apenas no papel. Empresas de fachada eram abertas e fechadas conforme a conveniência do esquema.

A maracutaia tributária, apelidada de soja-papel, foi descoberta pela Receita Federal e pela Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo em 2005, segundo reportagem publicada na época pelo jornal Folha de S. Paulo. Mais de R$ 1,5 bilhão em notas frias foram utilizadas. Somente a Casas Pernambucanas e a Tigre “exportaram” R$ 550 milhões. A rede varejista fechou pelo menos 12 operações entre dezembro de 2002 e agosto de 2004, pelas quais foi multada em R$ 340,5 milhões. A Tigre fez 13 operações e “exportou” 255 mil toneladas de soja. Levou multas de R$ 46,1 milhões. Ambas aderiram a um programa do governo paulista para reduzir os juros e multas nas dívidas de ICMS e acertaram as contas com a Fazenda estadual. Depois, as empresas voltaram-se contra as consultorias Deloitte e Globalbank, que seriam responsáveis pelo planejamento tributário fracassado.

A Casas Pernambucanas quer receber indenização de R$ 92 milhões da Deloitte. A Tigre, R$ 38,6 milhões. E a Ficap, R$ 5,1 milhões. Todas afirmam que aceitaram a solução tributária por causa da credibilidade que a Deloitte conferiu às operações. A Casas Pernambucanas e a Ficap também processam a Globalbank. As ações judiciais foram reveladas na sexta-feira 31 de agosto pelo jornal Valor Econômico. Desde então, a briga entre a Deloitte e a Globalbank tornou-se pública. Ambas colocaram anúncios pagos na imprensa na semana passada, defendendose das acusações e culpando- se pelo escândalo da soja-papel.

A Deloitte diz que foi contratada pela Globalbank unicamente para revisar os documentos e os registros contábeis. Isso ocorreu, segundo a Deloitte, antes mesmo de a Globalbank ter sido contratada pela Casas Pernambucanas e pela Tigre para fazer o planejamento fiscal. Por esse trabalho, recebeu honorários de R$ 495 mil. A “Globalbank, a empresa que coordenou essas operações, nos contratos assinados com suas clientes, responsabilizou-se pelo acompanhamento logístico e físico da soja relacionado às transações, inclusive pela eventual sustentação jurídica, nos âmbitos administrativo e judicial”, escreveu a Deloitte. A consultoria ainda afirma ter denunciado a operação às autoridades policiais tão logo tomou conhecimento das dúvidas sobre a idoneidade dos dodocumentos revisados. A Globalbank, em resposta, colocou a culpa na Deloitte: “A Deloitte afirmou a excelência da operação e se dispôs a apresentá-la a clientes dela.” E acrescentou: “A Globalbank Consulting, que tinha na Deloitte a garantia de correção e legalidade da operação, sente-se decepcionada com as tentativas desta de fugir a sua responsabilidade.”

Apesar das ações e dos anúncios, os executivos e os advogados das empresas envolvidas recusam-se a dar entrevistas sobre o assunto. Procurado pela DINHEIRO, o presidente da Deloitte, Alcides Hellmeister Filho, enviou nota de esclarecimento que reforça os argumentos defendidos no anúncio de jornal. Acrescentou que a Deloitte ajuizou ação contra a Tigre e a Arthur Lundgren, “visando ao ressarcimento de danos morais”. Segundo a nota, foi a Globalbank que procurou a Deloitte em novembro de 2002. “Diante da proposta, a Deloitte fez estudos internos e comprovou que a operação já era realizada pelo mercado por muitas empresas de porte e prestígio no Brasil, além de ter obtido pareceres favoráveis de juristas renomados a respeito de sua legalidade”, diz a nota.

Pedro Paulo Leoni Ramos, da Globalbank, não se manifestou. Peter Furukawa e Marcelo Silva, da Casas Pernambucanas, e Amaury Olsen, da Tigre, também não atenderam aos pedidos de entrevista. Executivos da Ficap e da Adria negaram-se a fazer comentários. A Secretaria da Fazenda de São Paulo alegou sigilo fiscal e não comentou os nomes citados. A dúvida permanece: afinal, de quem é a culpa?

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