Em busca do prêmio perdido
Por Catherine Vieira - Valor Econômico - 10/08/2007
Nestes tempos de turbulências, o que mais os investidores gostariam de ter seria uma bola de cristal que dissesse como vão caminhar as bolsas. O economista especializado em finanças John Campbell, da Universidade de Harvard, infelizmente ainda não criou a engenhoca, mas contou pela primeira vez a uma platéia de brasileiros na semana passada alguns de seus pensamentos sobre os rumos do mercado acionário global.
Com o mundo de olho na economia americana e nos problemas de crédito iniciado pelo setor de hipotecas de alto risco dos EUA (os chamados "subprime"), é preciso começar a se preocupar seriamente? Para Campbell, é importante ser cauteloso, pois provavelmente a economia americana não vai crescer no mesmo ritmo nos próximos tempos, mas, na sua avaliação, o resto do mundo poderia compensar isso. "O crescimento da Europa e sobretudo da Ásia podem atenuar os efeitos", disse ele. "É interessante notar que na China, por exemplo, os mercados foram mais resistentes às turbulências, isso foi um aspecto interessante".
Segundo ele, é possível que o mundo esteja observando um novo padrão nos mercados, diferente daqueles do fim do século passado. O que poderia indicar uma espécie de híbrido de touro com urso. Nos Estados Unidos, o "bullish" (que vem de touro) é sinônimo de mercado em tendência de alta enquanto o "bearish", o urso, é o mercado em baixa, numa alusão às figuras que formam as curvas de tendências. "Será que existe um meio termo entre o urso e o touro", perguntou Campbell à platéia da palestra que fez no Rio a convite da Mellon Global Investments e da Fundação Getúlio Vargas (FGV) sobre o tema "Quão grande é o prêmio das ações hoje?"
O economista apontou que, se os prêmios médios da renda variável vêm caindo no mundo todo, ainda há ágios a serem capturados. Além disso, o investidor pode ser complementado com a seleção de ativos alternativos. O início dessa diversificação já começou nos últimos tempos, beneficiando ativos de mercados emergentes, por exemplo. Ele citou como exemplo o próprio portfólio da Harvard Management Company, que já deu início a essa diversificação, alocando mais em "'private equity' e ativos de mercados emergentes".
Após testar alguns modelos, Campbell mostrou que seria razoável assumir que o prêmio médio global da renda variável hoje está em torno de 3,4%. Esse prêmio seria a média de ganho que poderia ser obtida acima dos ativos livres de risco. Como referência de ativo livre de risco ele usou os títulos americanos de longo prazo atrelados à inflação.
Segundo dados pesquisados por Campbell, num cenário otimista, esse prêmio médio poderia ser de 5,2%, caso a recente lucratividade das companhias continue sustentada com alto índice de reinvestimento nos negócios. "Mas se as médias de lucratividade e investimento caírem aos níveis médios do fim do século XX, então, esse prêmio seria de 2,8%", explicou o economista. No meio do caminho, se encontra o percentual de 3,4%.
O mercado americano, disse ele, é o mais afetado pelas estimativas de lucratividade, por isso poderia ter um prêmio médio um pouco superior à média mundial, de 3,6%. "Mas particularmente no caso dos Estados Unidos não devemos esperar que o futuro seja tão bom quanto o passado", afirmou Campbell.
Outra ressalva importante feita pelo economista é que o cenário de bonança da economia mundial contribuiu decisivamente nos últimos anos. "É importante notar que esses prêmios só estão nesses níveis porque as taxas de juros de longo prazo estão baixas", ressaltou ele. Ou seja, num cenário de política econômica mais restritiva com maior juro e menor crescimento mundial, as contas mudariam.
"Os métodos confiáveis para estimar o 'equity premium' (prêmio das ações) mostram números positivos, embora menores do que os excessos dos retornos históricos na maioria dos países", observou Campbell. "Esses números, porém, são mensurados em relação a uma taxa de juro de longo prazo média pouco acima de 2%, sendo que, nos anos 90, essa mesma taxa era de 3,5%", destacou o professor. "Em resposta a retornos reais menores, muitos investidores diversificaram agressivamente seus portfólios, mas ainda há recompensas para a diversificação inteligente", disse Campbell.
Ele evitou fazer previsões específicas sobre o mercado brasileiro, que disse conhecer pouco. "Espero aprender mais sobre isso com essa visita", afirmou. Questionado se a recente febre de lançamentos de ações na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) não poderia ser sintoma de uma bolha, Campbell disse: "Realmente um 'boom' de IPOs costuma ser um dos sintomas de que pode existir algum tipo de bolha, mas, no caso específico, é preciso analisar com cuidado e não necessariamente se trata disso", afirmou ele. "Há mercados nos quais a base anterior era muito baixa e onde havia uma demanda reprimida grande das companhias por esses recursos do mercado de capitais".
Segundo Delano Franco, diretor da Mellon e que mediou o encontro junto com Marco Bonomo, da FGV, a idéia é trazer mais especialistas estrangeiros para palestras desse tipo. "Há uma receptividade para esse tipo de evento. Os clientes têm uma curiosidade grande sobre visões de especialistas como John Campbell. Isso contribui para diversificar o debate", conclui ele, que já planeja um novo evento para o primeiro semestre do próximo ano.
Enviado por Ricardo Viana
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