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18 julho 2007

Educação e negócio

Educação não é mercadoria'
Instituições buscam melhorar gestão
ENSINO SUPERIOR Rede privada tem queda no ritmo de crescimento de faculdades, universidades e centros universitários; setor abre capital
Renata Cafardo Simone Iwasso
O Estado de São Paulo - 16/07/2007

A entrada de recurso estrangeiro no ensino superior privado, por meio da abertura de capitais, insere as instituições educacionais na mesma lógica de funcionamento de qualquer outra empresa, transformando o que seria um direito numa mercadoria. O raciocínio, extremamente crítico ao processo que está ocorrendo no Brasil, é da educadora Regina Vinhais, da Universidade de Brasília (UnB). "Sou totalmente contra qualquer tipo de iniciativa nesse sentido. Educação não é mercadoria, é direito da sociedade."

De acordo com a professora, um dos riscos embutidos nessa abertura para investimentos é a preocupação comercial, com o lucro, em detrimento da qualidade de ensino. "Temos de buscar uma qualidade internacional, mas não entrar em conglomerados, como está ocorrendo", diz.

"Se tiver risco para o ensino, é só de melhorar", discorda o ex-ministro Paulo Renato Souza. Para ele, maior profissionalismo das instituições resulta em mais qualidade da educação. "Isso não quer dizer que vão deixar de existir instituições como USP ou Harvard", completa. Paulo Renato acredita que são perfis diferentes de instituições que passam a formar o cenário do ensino superior. As particulares, que partem para uma abertura de capital, buscam mais e mais alunos e um ensino de massa. "O desafio delas não é oferecer excelência, e sim tentar fazer diferença na vida daquele aluno." R.C. e S.I.

Diminuiu o ritmo de crescimento do número de universidades, centros universitários e faculdades privadas no Brasil. O índice de aumento entre 2006 e 2007, até agora, está em 0,14%. O porcentual é muito inferior ao crescimento médio de 13% registrado anualmente desde 1997. Desde o ano passado, instituições fecharam, outras foram compradas por grandes grupos e poucas cresceram. Num setor já consolidado e de concorrência voraz, só sobrevive agora quem investir para profissionalizar a gestão. E a novidade da vez é a venda de ações na Bolsa de Valores. Na semana passada, a maior universidade do País em número de alunos, a Estácio de Sá, abriu seu capital para investidores. A expectativa é captar R$ 800 milhões. O grupo mineiro Pitágoras, que tem 190 mil alunos em escolas e faculdades, seguiu o mesmo caminho no início deste mês.

As duas foram embaladas pelo sucesso da precursora nesse tipo de operação no ensino superior brasileiro, a Anhanguera Educacional. A procura pelas ações da instituição foi 12 vezes maior que o esperado, e o valor total da operação ficou em US$ 250 milhões (R$ 466,9 milhões). "É um movimento fantástico, você consegue atrair investimentos cada vez maiores", diz Alexandre Saigh, sócio do Banco Pátria, responsável pela operação da Anhanguera. Depois da abertura, a instituição, que surgiu no interior do Estado, comprou o Centro Universitário Ibero-Americano (Unibero) e chegou à capital. O processo de aquisições deve continuar, já que a Anhanguera prometeu a seus acionistas que cresceria cerca de 30%.

"Ao abrirem o capital, as instituições são obrigadas a ter uma relação de governança com transparência absoluta. Não pode haver caixa 2, nepotismo", diz o ex-ministro da Educação e deputado federal (PSDB-SP), Paulo Renato Souza. A nova realidade se choca com a tradição no País de instituições educacionais formadas por grupos familiares, muitas vezes de gestão amadora, estrutura de custo pesada e inchada. Nesse cenário, investidores internacionais são bem-vindos porque, mesmo sendo acionistas minoritários, estão mais acostumados com a cobrança e o monitoramento de resultados, diz Paulo Renato. A Anhanguera teve 75% de suas ações compradas por estrangeiros, uma tendência que pode se repetir com outras instituições. A limitação da participação de capital estrangeiro em universidades chegou a ser discutida na reforma universitária do Ministério da Educação, mas não saiu do papel. NOVO GRANDE NEGÓCIO'

"O setor de ensino superior caminha para atingir a maturidade, em um nível de profissionalização nunca antes obtido em sua história", acredita o consultor da área e presidente da Hoper Educacional, Ryon Braga. Os estudos da consultoria mostram que, nos próximos quatro anos, entre cinco e oito novos grupos de educação devem abrir capital. "Das cinco maiores instituições privadas do Brasil, duvido que alguma delas não irá daqui para frente abrir o capital", completa o especialista no setor e proprietário da CM Consultoria, Carlos Monteiro. A tendência atual - que não atinge apenas o setor educacional - é explicada por uma conjunção de fatores internos e externos. O Brasil vive um momento de economia estável e queda de juros, o que torna a Bolsa de Valores um caminho atraente para captar recursos. "A educação é um novo grande negócio, como já disse Bill Gates", completa o ex-ministro. Paulo Renato acredita que ainda há espaço para crescimento no número de alunos no ensino superior privado - hoje são 3,2 milhões no País -, principalmente porque o governo tem financiado as mensalidades. Programas como o Universidade para Todos (ProUni) oferecem milhares de bolsas por ano em instituições particulares para estudantes de baixa renda. Há especialistas, no entanto, que defendem que só o crescimento das vagas em universidades públicas vai aumentar o índice atual de apenas 11% dos jovens de 18 a 24 anos no ensino superior. Segundo números do MEC há atualmente 2.141 instituições privadas de ensino superior no Brasil. Em 2006, eram 2.138. As aparentes três instituições a mais são, na verdade, um resultado entre as que fecharam e as que foram abertas de um ano para o outro. O MEC ainda não tem o número do total de novas instituições de 2007. Entre 2005 e 2006, porém, o índice de crescimento havia sido de 10,5%, com 204 novas instituições. Desde 1997, foram criadas mais de 1.400 universidades, faculdades ou centros universitários no País.

Muitas delas, no entanto, devem ser compradas ou fundidas umas às outras. "As instituições terão de trabalhar num mercado onde ou você cresce ou é engolido, como o que acontece no sistema bancário", diz Monteiro. Para Braga, cerca de 600 instituições devem "sair do mapa" nos próximos anos. O que vale mais para fechar um bom negócio é o status de centro universitário ou de universidade. As instituições que recebem uma das duas nomenclaturas - criadas pelo governo federal nos anos 90 - têm o direito de abrir novos cursos sem prévia autorização do MEC, ao contrário do que ocorre com faculdades. A cidade-sede também faz diferença; instituições em São Paulo, onde há muitos alunos em potencial, são mais valorizadas. Apesar de ainda não confirmado, circula no mercado que a Estácio de Sá pagou R$ 60 milhões pelo Centro Universitário Radial (UniRadial), com cerca de 10 mil alunos.

No ano passado, a Faculdade Tancredo Neves fechou as portas por falta de alunos. A Anhembi Morumbi continua existindo, mas teve, em 2005, 51% de seu capital comprado pela Laureate Education, uma rede internacional de universidades. Outros grupos do exterior também já negociam a sua entrada no País por meio de compra de instituições.

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