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16 novembro 2006
Vale x governo 2
Anteriormente coloquei uma reportagem informando que a Vale entraria com uma petição contra o governo (clique aqui para ler).
O presidente da Funai, Mércio Gomes, em entrevista no Estado de hoje dá a entender que a Vale tem a obrigação de cuidar dos índios.
A seguir a reportagem:
'A Vale dá a entender que atende índios por benevolência, mas é obrigação'
Antropólogo reage à iniciativa da empresa de recorrer à OEA contra o governo e a acusa de fugir de suas responsabilidades
Roldão Arruda
A decisão da Companhia Vale do Rio Doce, que acaba de formalizar uma petição contra o governo brasileiro na Organização dos Estados Americanos (OEA), irritou o presidente da Fundação Nacional do Índio, o antropólogo Mércio Pereira Gomes. Na opinião dele, a acusação de que o governo não cumpre suas obrigações com os índios, tornando-os cada vez mais dependentes de verbas que a mineradora repassa às suas comunidades, é um jogo de cena. A Vale estaria fazendo isso para tentar se eximir das obrigações que assumiu na época da privatização.
Em entrevista ao Estado, o antropólogo diz que, se for convocado para defender o País na OEA, pode provar que a mineradora está socialmente 'inadimplente' e quer se livrar do dever contratual de amparar os índios que vivem na região das jazidas que explora: 'A Vale dá a entender que atende a população indígena por benevolência, mas trata-se de uma obrigação.'
Como o senhor vê a acusação de que o País não cumpre suas obrigações com a população indígena?
Sou a favor de melhorias no trabalho com os indígenas. Mas a Vale também tem obrigações e não pode fugir da raia. Ao receber, por tempo indeterminado, o direito de exploração da maior mina de ferro do mundo, ela se comprometeu a defender o ecossistema, preservar as belezas cênicas, produzir alimentos para a população envolvida no trabalho de mineração e amparar os indígenas localizados nas proximidades. Isso ficou estabelecido por meio de uma resolução do Senado, de 1986, que foi confirmada por um decreto presidencial em 1997 - dois meses antes da privatização. Estamos falando de uma jazida de ferro de 411 mil hectares, que, mesmo com a retirada diária de 250 mil toneladas de minério de ferro, como acontece hoje, a empresa vai levar 470 anos para exaurir. Isso sem contar as jazidas de ouro, bauxita, magnésio e outros minérios que existem por ali, em menores quantidades.
A Vale diz que cumpre suas obrigações, paga regularmente os índios, e tem sido vítima de chantagens.
O problema não é o dinheiro, e sim a incompreensão da questão. A Vale não consegue estabelecer uma relação correta com os índios - e foi isso que deu origem aos conflitos, com as invasões de suas dependências. Eu já disse a diretores da empresa que eles são incompetentes e amadorísticos no tratamento dessa questão.
Como chegou a essa conclusão?
Na área ambiental, logo após o decreto de 1997 a Vale fez um acordo com o Ibama e criou um departamento especial com 60 técnicos, muitos deles com doutorado. Mas, para o trato da questão indígena, até hoje eles não têm nenhum antropólogo, sequer um indigenista para conversar com os índios. Por que essa terrível má vontade? Se fosse capitalista da Vale, eu recomendaria aos executivos que entrassem em entendimento com os índios. Por vários motivos. Um deles é a recente aquisição, de uma empresa canadense, da maior mina de níquel do Brasil. Como um terço dessa mina está em território xicrim, é obvio que em algum momento será preciso negociar com eles.
Até agora a Vale conviveu com os índios aparentemente sem problemas. O que causou a mudança e levou a três invasões neste ano?
Durante certo tempo a Funai mediou as relações entre os índios e a Vale. O dinheiro era entregue à Funai, que executava os programas. Mas alguém sugeriu à empresa que tratasse diretamente com os índios. Ela aceitou a idéia e desembestou numa série de programas, com liberação de dinheiro, em termos de ajuda de custo. Foi a Vale que introduziu essa prática. A Funai nunca repassou dinheiro diretamente. No primeiro semestre deste ano, a Vale impôs um acordo, no qual dizia que haveria reajuste do pagamento após o dia 11 de setembro. Quando chegou a época, os índios pediram uma reunião para tratar do assunto, mas a empresa ignorou, dando origem à explosão.
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