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31 outubro 2006
Informação privilegiada
A redução da quantidade de informação privilegiada é um sintoma de melhoria do mercado de capitais. Se anteriormente a existência de tal fato não ruborizava ninguém, neste momento tal prática tem sido objeto de reportagens e quem sabe um dia será notícia na coluna policial. A seguir uma reportagem interessante do Valor de hoje sobre esta questão:
O perigo da informação privilegiada
Por Daniele Camba e Danilo Fariello
Antes de comprar uma ação, o investidor geralmente analisa os fundamentos da companhia e, se são bons, conclui que o papel deve se valorizar em bolsa e por isso segue adiante. A prática, no entanto, nem sempre é igual à teoria. Muitas vezes uma ação sobe ou desce sem nenhuma relação com fatos públicos, mas sim com acontecimentos que ainda poucos sabem. Investidores usam essas informações privilegiadas (chamadas de "insider information") para negociar ações antes que todo o mercado saiba e, assim, conseguir bons ganhos, sozinhos.
Casos recentes, como o de Telemar e Perdigão, que estão sendo investigados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) por suspeita de uso de informação privilegiada, mostram que o investidor comum precisa ter cuidado pois, por mais desenvolvido que o mercado seja, o desempenho de uma ação pode variar conforme o fluxo dessas informações entre poucos.
A autarquia vem atuando de forma cada vez mais ativa para fiscalizar e coibir esse tipo de prática. Nos últimos anos, cresceu o número de casos de "insider" julgados. Em 2004, houve só o julgamento da Fator Administração de Recursos (FAR) e de seu sócio, Walter Appel, que foram condenados pelo uso de informação privilegiada na negociação de ações ordinárias (com direito a voto) da Copel. Em 2005, já foram seis casos. Este ano, até julho, foram julgados três e outros seis casos estão sob investigação.
"O uso de informação privilegiada tira a racionalidade do mercado e o direito de todos participarem em igualdade de condições", diz o professor do Ibmec-Rio e ex-superintendente de Relações com Empresas da CVM, Fábio Fonseca.
Este ano, até setembro, 261 ações ou fundos de investimentos caíram numa espécie de filtro da CVM por algum tipo de suspeita de operação irregular, como "insider", manipulação de preços e lavagem de dinheiro, segundo o superintendente de relações com mercado e intermediários da autarquia, Waldir de Jesus Nobre. Apenas em 39 destes havia indícios suficientes de irregularidade, portanto, foram levados à frente com um termo de acusação, que pode ir a julgamento.
No ano passado, a luz amarela da CVM acendeu em 162 ações ou fundos, mas, em compensação, 56 se transformaram em termos de acusação. A autarquia acompanha o mercado diariamente e em tempo real por um sistema que revela o comportamento de todas as ações como volume financeiro, número de negócios e oscilação. O papel cai num filtro e passa a ser observado de perto quando um ou mais indicadores fogem da média dos 60 últimos pregões, diz Nobre.
Indício de algo anormal pode ser considerado, por exemplo, o comportamento de um fundo de renda fixa em setembro. A carteira teve saque de R$ 62 milhões, valor equivalente a 38% da captação líquida no ano. No dia seguinte, o fundo teve perda de R$ 9,9 milhões, ou 0,68% do patrimônio, porque investia em debêntures da CP Cimento que entraram em default. Quem saiu um dia antes, livrou-se do prejuízo.
O passo seguinte é investigar se há motivos para o comportamento anormal. Na maior parte dos casos existe uma explicação pública, como queda nas vendas da empresa ou uma expectativa de um resultado pior no trimestre seguinte, exemplifica Nobre.
O restante são aqueles em que há indícios de que uma ou mais pessoas negociaram as ações com base numa informação que não é de domínio público. É neste pequeno grupo que está a grande dificuldade da CVM em conseguir fatos contundentes que comprovem que houve "insider". "Cerca de 40% desses casos são arquivados por falta de prova", lamenta Nobre.
Um dos grandes problemas é que a investigação da CVM fica restrita aos possíveis envolvidos e apenas no âmbito do mercado. "O melhor dos mundos seria se o 'insider' fosse o diretor da companhia", diz Nobre. "Mas em muitos casos existe toda uma teia de pessoas envolvidas e fica impossível pegá-las sem a quebra de sigilos bancário, telefônico e do cartão de crédito". Ele lembra que, com a implantação da Transferência Eletrônica Disponível (TED), ficou ainda mais difícil chegar na ponta do novelo. "Quando as operações eram pagas com cheque, conseguíamos pelo menos saber de onde saiu e para onde foi o dinheiro", diz Nobre.
Se a prática de "insider" torna o mercado injusto a todos, para o investidor pessoa física é pior, já que ele não está no pregão acompanhando o desempenho das ações de perto. "Quando esse investidor se dá conta, o papel já caiu 20%", diz Fonseca. Mas algumas dicas podem ajudar a evitar essas emboscadas nos investimentos.
As ações de segunda e terceira linhas e com valor unitário baixo estão mais suscetíveis a manipulação, lembra Fonseca, que acompanhou esses casos de perto quando estava na CVM. "Como são ações baratas, com poucos recursos o 'insider' consegue fazer um bom ganho". As vedetes do mercado, no entanto, não estão imunes. Por terem muita liquidez, o "insider" pode passar despercebido, mas terá de gastar alguns milhões para conseguir lucrar significativamente.
Seguindo o ditado de que onde há fumaça há fogo, é importante o investidor estar de olho em mudanças bruscas de volume e preço dos papéis, que podem ser os primeiros sinais de "insider". As ações de empresas ou setores que estejam passando por fusões, aquisições ou reestruturações societárias também são mais passíveis de manipulação, diz Luís Fernando Lopes, do Pátria. Aumentam as chances de manipulação em dias que antecedem a divulgação de balanços ou no vencimento de contratos futuros, diz Lopes. Por isso, o fundo de arbitragem do Pátria não negocia esses ativos nesses momentos.
Apesar de ser uma prática impossível de controlar, as empresas podem fazer a sua parte, dificultando esse tipo de vazamento. Uma saída, segundo o ex-superintendente da CVM, seria a companhia divulgar dados preliminares do balanço o mais rápido possível. Outra prática benéfica seria proibir diretores e executivos de negociar ações em alguns períodos.
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