A contabilidade possui muitas utilidades. Em geral quando
aprendemos os primeiros passos na área concentramos nossa atenção nas empresas
de serviço ou comercial, com fins lucrativos. E o uso que fazemos das
informações obtidas geralmente está associado a uma decisão financeira:
emprestar dinheiro para empresa, investir em ações, verificar a chance de
falência, etc.
Iremos tratar hoje de uma entidade sem fim lucrativo. E
nosso objetivo é um pouco diferente das situações usuais. Vamos observar as
informações contábeis do Instituto Ronald McDonald, uma entidade associada à
empresa de fast-food McDonald´s. E nosso objetivo é tentar ajudar você a tomar
uma decisão bem simples: você deve ajudar ou não o Instituto? Geralmente em
agosto a rede de sanduíche promove o “McDia Feliz”, onde o cliente pode
consumir um Big Mac, o principal sanduíche da rede, e o recurso arrecadado,
exceto alguns impostos, é revertido para instituições de apoio e combate ao
câncer infanto-juvenil no Brasil.
O Instituto Ronald McDonald disponibiliza um Relatório deAtividades desde 2004.
Isto é um ponto positivo, já que a entidade está disposta a mostra o que faz
com o dinheiro obtido nas campanhas. Vamos analisar somente o último relatório,
mas você poderá notar que não existe muita diferença entre eles.
O relatório de atividades possui 72 páginas e é muito bem
produzido. Mostramos a seguir a primeira página, com um desenho feito por uma
criança de Santa Catarina. O objetivo do relatório de atividades já aparece
muito claro aqui: comover o doador. O texto é dividido em Conselhos, Mensagem
do Presidente, Quem somos, Programas, Projetos, Fontes de Recursos,
Solidariedade traduzida em números, Transparência, Mensagem do Superintendente
e Ficha Técnica. Cada um destes capítulos possui uma cor diferente, mas o
padrão de apresentação é basicamente o mesmo: uma apresentação bonita, com
muitas fotografias de crianças e um texto agradável.
No capítulo de Fontes de Recursos ficamos sabendo que foram
vendidas 1,8 milhão de unidades em 2013, com uma arrecadação de 20,4 milhões de
reais. Isto equivale a 11,33 reais por unidade vendida e fez com que o ano de
2013 batesse o recorde da campanha.
Vamos olhar as informações contábeis, que estão no capítulo
Transparência. Este item começa com a “carta de auditoria”, assinada pela EY,
uma das grandes empresas de auditoria, o que daria uma tranquilidade para o
doador. Logo no segundo parágrafo a EY fala que examinou as “demonstrações
financeiras” que “compreendem o balanço patrimonial em 31 de dezembro de 2013 e
as respectivas demonstrações do resultado das atividades sociais, das mutações
do patrimônio social e dos fluxos de caixa (...) assim como o resumo das
principais práticas contábeis e demais notas explicativas”. E esta carta afirma que está tudo certo com
as informações. Isto parece ser um alívio para o leitor que deseja consumir seu
Big Mac para ajudar as criancinhas.
Vamos então olhar as demonstrações financeiras do Instituto.
Na página seguinte temos o balanço patrimonial, que se encontra reproduzido
abaixo. A entidade possui um “caixa e equivalentes de caixa” de 13,7 milhões,
que corresponde a 55% do ativo. (Volte no texto e veja que em 2013 o instituto
vendeu 20,4 milhões de reais durante a promoção; parece que quase 70% estão “descansando”
no caixa). A figura mostra que os detalhes desta conta estão na nota
explicativa “4”. Existem 10,4 milhões de recursos repassados, que é explicado
na nota 5.
No passivo existem 5,5 milhões de recursos a repassar e o “fundo
social”, que corresponde ao capital social numa empresa, é de 16,4 milhões ou
dois terços do lado direito. Observe o leitor que destacamos a seguinte informação:
“as notas explicativas são partes integrantes das demonstrações financeiras”.
Bom, então vamos para as notas explicativas. Se o leitor
tiver a curiosidade de acompanhar este texto com as demonstrações financeiras irá
perceber que a carta do auditor está na página 67, o balanço patrimonial na
página 68 e página seguinte é outro capítulo, qual seja, a “mensagem do
supervisor”. É isto mesmo: a “transparência” limita-se a duas páginas! E as
notas explicativas – conforme a carta e a figura acima? Não são apresentadas
para o leitor. E as outras demonstrações financeiras que o auditor disse que
analisou? Também não são apresentadas. Ou melhor, parece que é de uso e análise
exclusiva da EY, a empresa de auditoria.
Ficamos curiosos em saber quem era o contador do Instituto.
Mas isto também não é objeto do Relatório de Atividades. Se o leitor for mais
curioso ainda poderá verificar que em nenhum dos relatórios anteriores as
demonstrações são apresentadas completas.
Para finalizar encaminhamos a seguinte mensagem para o
Instituto:
Estava lendo o
relatório de atividades do Instituto e percebi que o auditor comenta sobre
"notas explicativas" e "outras demonstrações". Entretanto,
o relatório só apresenta o Balanço Patrimonial. É isto mesmo?
Vamos ver se teremos uma resposta.
Curso de Contabilidade Básica - Editora Atlas - César Augusto Tibúrcio
Silva e Fernanda Fernandes Rodrigues (prelo)
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